sexta-feira, setembro 23

Design Com a Sociedade

O pesquisador Victor Margolin recentemente (2003) escreveu um artigo sobre o que classifico como Design Socialmente Orientado onde este autor menciona que as diferenças do processo de design para o ¨modelo de mercado¨ ou para o ¨modelo social¨ são definidas, muito mais, pelas prioridades de uma comissão de pesquisa do que por um método de distribuição ou de produção.

Margolin argumenta que muitos produtos projetados para o mercado de consumo também solucionam uma necessidade social, porém o mercado não pode se responsabilizar por todas as necessidades sociais, já que estas incluem as populações que não constituem a classe de consumidores no sentido de mercado, ou seja: as pessoas mais pobres ou com necessidades especiais devido à idade, à saúde, ou aos problemas físicos.

Para solucionar as necessidades das populações marginais, o autor descreve a prática laboral social onde um designer atuaria em conjunto a um grupo de trabalhadores sociais que fariam uma análise do que ocorre no sistema do usuário (pessoa, família, grupo, organização, ou comunidade) e os aspectos dentro do ambiente com o qual o sistema do usuário interage. Os variados aspectos que afetam o funcionamento humano são: o biológico, o psicológico, o cultural, o social, o natural, e o físico/espacial.

Na visão de Margolin, seria exatamente no aspecto físico/espacial onde um designer atuante do ¨modelo social de design¨ deveria intervir:

O aspecto físico/espacial, (...) abarca todas as coisas criadas pelos seres humanos tais como objetos, edifícios, ruas, e sistemas do transporte. Os arredores físicos inadequados e os produtos inferiores podem afetar a segurança, a oportunidade social, o nível da tensão, o sentido de pertencer, a auto-estima, ou ainda a saúde física de uma pessoa ou de várias pessoas numa comunidade. Um ajuste pobre, com um ou mais aspectos dominantes pode estar na raiz do problema do sistema do usuário, criando assim uma necessidade humana (Margolin , 2003, 2).

O autor segue definindo este método de trabalho, próprio das ciências sociais, onde os participantes tendem a seguir um modelo da prática do internista num processo de solução de problemas que compreende seis passos:

1. Contrato (compromisso),
2. Análise,
3. Planejamento,
4. Implementação,
5. Avaliação,
6. Finalização.

O processo inteiro se realiza em colaboração com o sistema do usuário. Outros profissionais de áreas diferentes podem ser convidados como parte da intervenção.

Na fase do contrato, o trabalhador social escuta o usuário e obtém um informe do atual problema.

Na fase seguinte, da análise, o trabalhador social observa holisticamente a interação do sistema do usuário dentro dos variados aspectos ambientais. A principal tarefa numa análise consiste em não tomar um problema de maneira superficial, e sim olhar mais profundamente o contexto onde se insere o sistema do usuário com o objetivo de atingir as raízes do problema.

O resultado da fase de análise é uma listagem de diversas necessidades a serem tratadas.

Na terceira fase, o planejamento, o trabalhador social se insere no sistema do usuário para conhecer suas necessidades, tentando determinar qual é a prioritária. Então o trabalhador social e o sistema do usuário estudam diversas soluções. Falam de várias idéias e decidem qual tipo de intervenção será mais efetivo. Juntos o sistema do usuário e o trabalhador social fazem uma listagem de metas e de objetivos.

Na fase seguinte, de implementação, a intervenção é dirigida pelas metas e objetivos mencionados na etapa anterior.

O autor prossegue sugerindo algumas opções de como um designer poderia colaborar com uma equipe de trabalhadores sociais. Ele argumenta que durante a fase da análise, o designer, como membro de uma equipe da intervenção ou como consultor, poderia identificar os fatores que contribuem para um problema. Na fase do planejamento, um designer poderia desenvolver as estratégias da intervenção relacionadas com o ambiente físico. Durante a implementação, o designer poderia criar um produto necessário ou trabalhar junto ao sistema do usuário para projetá-lo.

Estas estratégias diferenciam este pesquisador das idéias sugeridas por Vitor Papanek em seu polêmico Design for the real world. Papanek, traça as diferenças entre designers sociais responsáveis e os que desenvolvem seu trabalho num mercado comercial que prospere na produção excessiva de produtos inúteis. Áspero e criticando a economia de mercado, ele traça as opções para um designer social.

Papanek enfatiza que os designers sociais responsáveis devem organizar suas próprias intervenções fora do mercado de consumo, mas o autor não esclarece como isto poderia ser feito.

Margolín defende que profissionais sociais e designers que desejam desenvolver o trabalho social responsável, poderiam encontrar maneiras de trabalharem juntos. Este autor crê que os designers encontrarão muito mais aliados nas profissões relacionadas com a saúde, a educação, o trabalho social, o envelhecimento, e a prevenção do crime do que se pode evidenciar na análise de Papanek.

Margolín termina propondo uma ¨agenda para o design social¨ argumentando que um motivo pelo qual não há mais investimento para os serviços de design social é a carência de pesquisas para demonstrar como pode contribuir um designer ao bem-estar humano. Desta maneira, propõe uma ampla agenda de pesquisa para o design social que deveria começar avaliando um número de perguntas:

• Que papel pode um designer desempenhar num processo de colaboração na intervenção social?
• O que se está fazendo atualmente a respeito e o que poderia ser feito?
• Como se poderia apresentar à sociedade uma imagem de um designer social responsável?
• Como podem as agências que financiam os projetos e pesquisas da assistência social obterem uma opinião mais consistente do design como atividade social responsável?
• Que classes de produtos solucionam as necessidades de populações vulneráveis?

Cremos que alguns destes aspectos já começam a ser implementados, como vimos nos exemplos anteriores, porém ainda existe muito por fazer.

O próprio autor responde a estas perguntas e sugere algumas perspectivas futuras argumentando que pode-se fazer uma aproximação multifacetada para explorar estes e outros temas. Pesquisas e entrevistas com os profissionais do serviço social, com os designers e administradores de agências de recursos humanos poderiam ser realizadas como tentativa de recopilar informação sobre opiniões e atitudes, além de solicitar sugestões para tais mudanças. A análise do conteúdo de arquivos de dados tais como diários, jornais, e revistas poderiam ser utilizadas para reconhecer como os meios informativos divulgam as aplicações do design social.

Margolín propõe outra alternativa como método de pesquisa para detectar onde e como um designer poderia intervir responsavelmente: o método da observação participante. Isto exigiria aos designers que incorporassem alguns aportes metodológicos das ciências sociais, com o objetivo de observar e documentar as necessidades sociais que podem ser satisfeitas com intervenções do design.

O autor diz também que para criar produtos novos os designers deveriam deter-se a pesquisas com a finalidade de saber como traduzir suas idéias em projetos acabados. Seria necessário avaliar estes produtos em situações reais para provar sua eficácia. Seria importante, também, que o campo social do design tivesse um compêndio dos estudos de caso que documentam exemplos da prática relevante.

O autor conclui dizendo que o alcance da pesquisa para o design social inclui as opiniões do público e de designers, assuntos econômicos relativos a agência de intervenções sociais, a importância do design que tenta melhorar a vida de populações desfavorecidas, uma taxonomia das tipologias de produtos novos, os benefícios econômicos atingidos pela fabricação de produtos sociais responsáveis e a maneira pela qual estes produtos e serviços são recebidos pelas pessoas.

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Este texto é parte de um artigo originalmente publicado na revista Design Gráfico de abril de 2004 (ano 9 nº 81)
Texto Original "Social Design" de Vitor Margolin em www.icograda.org

7 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

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sexta-feira, 23 setembro, 2005  
Anonymous Anônimo disse...

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sexta-feira, 23 setembro, 2005  
Anonymous Anônimo disse...

Bianca,
Responsabilidade social em programação visual é fundamental dentro do estar das coisas do mundo globalizado neo-liberralista em que estamos.
Adorei a idéia desse espaço, vou divulgar.
Beijo
Gloria Dettmar

domingo, 25 setembro, 2005  
Anonymous Anônimo disse...

Esta atenção que Margolin destaca em relação a categorias marginais parecem verdadeiras micropolíticas onde o designer pode atuar como figura chave para encontrar soluções adequadas, considerando recursos e características específicas.

segunda-feira, 26 setembro, 2005  
Blogger Giuliano disse...

Hei.

Achei as tuas postagens interessantes e aproveito para te convidar para dar uma olhada no meu:
http://sodesign.blogspot.com
Ele é beeem menos teórico, mas também é uma "leitura" mais leve.
Dá uma passada lá.

sexta-feira, 30 setembro, 2005  
Anonymous Anônimo disse...

...muito mais, pelas prioridades de uma comissão de pesquisa do que por um método de distribuição ou de produção...
Esse assunto é interessante e não submete apenas o design à outros interesses externos à disciplina (qualquer que seja ela). Acho importante entendermos o mundo onde vivemos para conseguirmos nos inserir nele de uma forma mais benéfica, ou, se preferem, mais social, mais humana. Sobre esse assunto sugrio a leitura de três livros: Corrida para o Seculo XXI, A : No Loop da Montanha Russa, do Nicolau Sevcenko; Pós-Modernismo - A Lógica Cultural do Capitalismo Tardio, do Fradric Jameson; e A identidade cultural na pós-moderndiade, do Stuart Hall. E ainda tem esse artigo que vale muito a pena: www.scielo.br/pdf/ra/v47n1/a06v47n1.pdf.

...Papanek enfatiza que os designers sociais responsáveis devem organizar suas próprias intervenções fora do mercado de consumo, mas o autor não esclarece como isto poderia ser feito...
bom, no livro The green imperative ele comenta vários casos e deixa isso no ar... o exemplo da carreta coletora de lixo eu acho fantástico, posso te enviar se quiser (qualquer cosia, me escreva: cuducos arroba gmail.com).

sexta-feira, 25 novembro, 2005  
Blogger Sá Fortes DESIGN disse...

Parabéns pelo texto.

Abraços

terça-feira, 16 junho, 2009  

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